Por Mariana Suete
Em torno de 30% da população mundial sofre com a dor crônica, ou seja, aquela que persiste por mais de três meses. Uma epidemia de uma doença complexa e mal compreendida. Sim, uma doença em si. Quando a dor persiste por mais meses, ela altera todo o nosso sistema nervoso, desde a periferia até o cérebro. O conjunto dessas alterações faz com que o nosso corpo se torne mais eficiente em sentir e transmitir dor, como se a pessoa agora tivesse mais sensações dolorosas, com estímulos menores e, às vezes, até mesmo com estímulos não dolorosos, como um abraço ou o simples toque da roupa na pele.
Além disso, o nosso sistema de analgesia interna começa a não funcionar tão bem. Tudo isso torna a dor crônica uma doença. Uma doença complexa, uma doença com um profundo impacto biopsicossocial.
Eu costumo dizer que a dor toma conta de tudo. Os pacientes com dor crônica perdem capacidade física, têm dificuldades em completar as tarefas domésticas, muitas vezes param com suas atividades físicas de lazer, praticar exercício físico, então, nem pensar! Sem contar que essas pessoas dormem mal e têm um déficit de energia; elas sempre estão cansadas.
Também existe profundo impacto emocional, com mais irritabilidade, agressividade, ansiedade e depressão. Os pacientes com dor crônica têm, inclusive, duas vezes mais chance de cometer suicídio. Além disso, existem as consequências sociais, uma vez que há prejuízo aos relacionamentos conjugais e familiares, problemas com intimidade e uma tendência ao isolamento social.
Os altos custos do tratamento com médicos, remédios e procedimentos somados à queda da capacidade laboral e da produtividade contribuem para um impacto socioeconômico real. Mas isso não é o que dói mais. A maior dor é a da incompreensão, de não se sentir visto, não se sentir compreendido pela família, pelos amigos e, até mesmo, pelos médicos.
Dor da falta de empatia, dor de ouvir frases como “Isso é coisa da sua cabeça”, ou pior ainda, “Isso é falta de Deus”.
Dor pela frustração de não obter resultados, mesmo que tenha buscado vários médicos, remédios e procedimentos.
Dor pela perda da saúde mental, da sobrecarga e do estresse crônico que acompanham a dor constante.
Dor pela solidão.
A invisibilidade da doença, os sintomas subjetivos, a falta de compreensão e conscientização contribuem para esse sentimento.
É por isso que falar sobre esse assunto faz tanto sentido e é tão importante.
A dor crônica é uma doença complexa com um profundo impacto na vida, em todas as esferas da vida do doente.
A dor não é frescura.
A dor não é falta de Deus.
A dor não é coisa da cabeça.
A dor é uma doença e deve ser tratada como tal.