Há alguns anos, me deparei com minha avó, 90 anos, precisando de cuidado. Lúcida, vaidosa, unhas bem-feitas desde que nasci, cabelo curto escovado, roupas alinhadas e jamais sem batom.
Quando me dei conta, eu saía de Vitória e ia para Cachoeiro do Itapemirim passar o fim de semana ‘cuidando’ dela. Ela não percebia e muito menos eu, pois além de ajudá-la em sua rotina, banho, remédios etc.. eu a deixava feliz, pois, conhecia suas preferências, tinha sensibilidade para perceber que havia chegado a hora dela fazer o que bem entendesse. E foi assim!
Cuidei até o final com todo o suporte médico e nunca esquecendo a quarta-feira da unha, a sexta sagrada do cabelo, e o pastel na feira da Rua Constante Sodré. Ela morreu aos 98 anos, muito bem e em paz.
E aí, a Rê nasceu, eu nasci. Já com muitas leituras, e muitos questionamentos sobre o que é cuidar. E nasceu uma pessoa que aprecia especialmente cuidar no final da vida, nas últimas horas – por mais incrível e raro que isso pareça!
Trocar uma fralda ou dar um banho é algo mecânico. Você ensina e a pessoa aprende. Mas cuidar vai infinitamente além para mim, e é sobre isso que estou em busca todos os dias. Eu faço o cuidado dos meus sonhos! Aquele que tem desenho, música, fivela no cabelo, coberta florida, muito respeito e empatia.
Renata Gomes, cuidadora e doula do fim da vida, gente que cuida.
