Cuida

Quando começamos a preparar as nossas crianças para a morte?

Por Carol Sarmento

Quando começamos a preparar as nossas crianças para a morte? Não delas necessariamente, mas de quem e do que elas amam? Hoje me peguei pensando muito nisso…

Estes dias, estive muito perto de uma criança que amo, meu sobrinho. E me lembrei da Carolina criança, que tinha uma paúra tremenda em pensar sobre a morte, especialmente a da minha mãe. Se ficava na escola de música e ela ia ao mercado, eu chorava. Pensava que algo de mal tinha acontecido a ela. Se ela atrasasse 10 minutos, eu chorava mais ainda. E chorava, chorava, chorava.

Como cuidei disso? Não tenho receita, mas lembro de ter falado sobre isso com minha mãe, e ter sido acolhida. De ter ido visitar amiguinha próxima e outras pessoas chegadas quando doentes no hospital, ter sido informada do falecimento delas, e ter sido levada – com carinho, com desejo manifesto meu e sob observação – aos serviços funerários e despedidas. Lembro de ter cuidado de animais de estimação no final da vida, e de tê-los enterrado de maneira cuidadosa e carinhosa. E lembro de ter tido a (não tão brilhante) ideia de visitar o cemitério onde meu avô tinha sido enterrado em busca do túmulo dele com mais um grupo de coleguinhas, numa espécie festiva de “ganha quem achar primeiro”. Detalhe: ninguém achou, ninguém ganhou o “pique-túmulo”.

A Carolina criança deu lugar a uma adulta que também estuda e cuida de pessoas no final da vida. E que entende a importância de cuidar na morte em todas as fases da vida, para toda a gente, em todas as idades – obviamente de maneira proporcional, compassiva e acessível às diferenças pertinentes.

Hoje atendi uma senhora idosa, em processo ativo de morte, cuidada e confortável. Ao lado dela, juntinho ao leito, estava o neto pré adolescente, de 11 anos, dormindo, de mãos dadas. Isso me sensibilizou de tal maneira… e pude conversar com o pai do menino, filho da paciente, sobre a cena que eu assistia. Ele disse que o garoto fazia toda questão de estar ali, participando dos cuidados com a avó, passando a noite com ela, ajudando no que podia. E que os dias das férias dele estavam sendo diferentes e especiais, por estar cuidando da avó junto dos familiares, no hospital.

Parabenizei o pai, que me mostrou, emocionado, a mensagem do garoto no celular: “pai, em breve estaremos todos juntos. Estou contigo e estamos juntos”.

Saí do quarto miudinha e fui chorar quietinha? Ah, se fui! O tanto que esses dias vão impactar a vida desse menino. Uau, como vão! O tanto que ele, acredito eu, vai sentir e também poderá levar dessa experiência humana cheia de cuidado para a vida. Uau!

Sempre penso que nós, médicos, aprendemos cuidando de gente. E somos sortudos em ver cenas como essa na lida: um garoto segurando a mão da avó, deitado pertinho, presente e junto dela no final da vida. Aprendi muito hoje. Muito.

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