Por Janaína Garcia
Como já bem abordado no blog do Cuida, a espiritualidade não se limita a qualquer crença ou prática religiosa. Ela é mais do que uma fonte de recursos para enfrentamento de situações de estresse, quando a saúde se encontra ameaçada. A espiritualidade, por si só, é uma oportunidade de buscar o sentido e o propósito da existência, mesmo em contextos tão desafiadores.
Trabalho há vários anos com pacientes renais em estágio avançado, recebendo terapia renal substitutiva. Esse é um tratamento crônico, estigmatizante, com muitas restrições (dietéticas e hídricas) e que debilita o paciente ao longo dos meses e anos de terapia. Em geral, a abordagem sobre espiritualidade no contexto da saúde acaba sendo dificultada por ser uma temática considerada não essencial, relegada ao segundo plano. Muitos pacientes ainda têm dificuldade de refletir e compartilhar seu propósito de vida, e a busca por sentido é muitas vezes vista como algo inacessível e inviável. Mas como desenvolver a espiritualidade frente a tantas dificuldades enfrentadas?
Bom, existem muitas atividades que podem favorecer a vivência da espiritualidade pessoal e intransferível de cada um. Enquanto profissionais de saúde podemos auxiliar nessa busca, estimulando atividades diversas, como: Estudar um assunto, participando de cursos e eventos. Aprender algo novo (idiomas, culinária, dança, pintura, artesanato, cerâmica, marcenaria, fotografia). Visitar exposições e eventos culturais. Praticar um esporte. Aprender a cantar e tocar um instrumento. Participar de uma orquestra e grupo de coral. Fazer parte de grupos de estudos de literatura, arte, cinema e religiões. Investir na própria carreira ou na transição através de cursos e mentorias. Empreender e criar algo novo. Ensinar algo. Viajar e conhecer novas pessoas e culturas. Cuidar de um animal. Praticar o voluntariado. Adotar práticas religiosas e/ou espirituais.
Nesta unidade de saúde que atendo, são oferecidas algumas atividades interessantes que visam auxiliar no desenvolvimento dessa espiritualidade:
- Psicoterapia individual, objetivando um maior autoconhecimento e busca pelo desenvolvimento de resiliência do paciente.
- Arteterapia semanal, realizada em grupo, que proporciona o compartilhamento de experiências, traumas e utiliza a arte como forma de expressão de angústias e soluções para os problemas vigentes.
- Musicoterapia e terapia assistida por animais. A música acalma e reduz sintomas ansiosos durante a rotina de um dia de tratamento. A interação com animais propicia o resgate de sensações como afeto, alegria e bem estar.
Como disse, são várias as possibilidades de trazer sentido ao nosso dia a dia e cabe a cada um de nós seguir em busca de tal propósito. Verifico nos pacientes dialíticos, que tenho o privilégio de acompanhar, o quão importante tem sido essas iniciativas e como isso fortaleceu a conexão entre eles e os profissionais de saúde, além de uma evidente melhora na adesão ao tratamento. Sei que os desafios são ainda maiores quando a vulnerabilidade social e doenças graves atravessam a existência desses pacientes. Sigo aqui na torcida para que eles (e nós, profissionais da saúde) não percamos de vista a nossa capacidade de deslumbramento frente a vida.
