Por Carol Sarmento
Era julho recente, meu sobrinho de 8 anos e minha mãe vieram passar uns dias em São Paulo comigo. E entre idas e vidas no trânsito a passeio, rolezinhos agradáveis por lugares que também me eram novidades aqui na cidade (afinal, não convivo diariamente com uma criança e a nobre missão de fazer coisas interessantes para ela), descobri que o menino era fã de Imagine Dragons, a ponto de cantarolar no seu inglês pueril-macarrônico alguns dos hits da banda.
Em um desses dias, indo passear no Instituto Butantan, ele me pede “tia, coloca Believer?”. Prontamente atendi o pedido, a música começou “TUM TI TÁ first things first…”, Dan Reynolds soltando a voz e o cantarolar no carro seguiu. E eu pude observar o efeito daquela música sobre o pequeno.
Quando já estava no refrão, que é aquela mistura de ritmo, ápice da coisa e “PAIN! You made me a, you made me a believer…” , eu que observava pelo retrovisor me emocionei ao ver uma criança de olhos fechados, batendo o ritmo com a mão, respirando calmo e, literalmente, viajando no momento. Mas não era qualquer viagem: meu sobrinho começou a me narrar o que se passava. Ele dizia: “tia, isso me faz respirar tão leve… ”, “tia, parece até que eu estou fora de mim cantando…”, “até parece que tô meditando…”, “nossa, isso faz tão bem…”. Discretamente, cutuquei minha mãe que ficou embasbacada vendo o neto, que parecia estar em outra dimensão: mas estava bem ali, no banco de trás, experimentando algo sublime que é a busca voluntária de muita gente grande.
Quanto a gente se propõe a estudar espiritualidade em saúde, especialmente sob uma ótica não proselitista, denominacional e religiosa, a gente aprende que essa conversa diz sobre ter meios para achar sentido e propósito na vida, através de conexão consigo, com outros, com o que tenha significado com o sagrado do indivíduo. Também pode ter relação com o que seja transcendente para a pessoa, com o que seja um estado que vá além do trivial do dia a dia e te permita experimentar bem-estar e conexão com algo elevado em significado. E essas tais práticas de espiritualidade podem ser expressas através de hábitos, atitudes, práticas; pode perpassar o caminho das artes, das crenças, do humanismo e das práticas culturais; e não necessariamente caminha em paralelo com religião e assuntos afins.
Ali, no banco de trás, pude ver uma criança de 8 anos transcender, ao ouvir Believer do Imagine Dragons. E aprendi que essa viagem para dentro, essa conexão transcendente não depende necessariamente de uma ida ao Butão, uma conversão religiosa ou uma experiência “plant based”, digamos: depende sim de aprender as ferramentas que me auxiliem a conectar com o que me seja sagrado, enxergá-las e utilizá-las, mesmo que elas estejam ali, na playlist pop rock.