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A (in)visibilidade trans no contexto da saúde

Por Equipe Cuida

A sociedade contemporânea, embora tenha experimentado avanços significativos na promoção da diversidade e da inclusão, ainda se depara com desafios persistentes no que diz respeito ao tratamento equitativo de todos os seus membros. No contexto brasileiro, as populações trans e travesti enfrentam obstáculos e desigualdades quando se trata de obter cuidados de saúde adequados.

É importante observar que “transgênero” é um termo abrangente usado para descrever indivíduos que se identificam com um gênero diferente daquele que lhes foi atribuído no nascimento ou que expressam seu gênero de forma diferente. As pessoas trans têm uma variedade de orientações sexuais, expressões de gênero e identidades de gênero que não dependem da aparência física ou de alterações hormonais e cirúrgicas. Mais de 3 milhões de pessoas no Brasil, ou cerca de 1,5% da população adulta, são transgêneros.

O Brasil, apesar de ter criminalizado a transfobia, infelizmente ainda detém o título de país que mais mata pessoas trans e travestis no mundo, conforme estudo da Transgender Europe (TGEU) divulgado em 2022. A TGEU é uma organização respeitável que monitora dados sobre questões LGBTQIA+ em todo o mundo.

No dia 29 de janeiro de 2004, um grupo de 27 pessoas transgêneros, entre travestis, mulheres e homens trans, foi a Brasília para afirmar a importância do respeito à diversidade. Desde então, essa data tem marcado um movimento para garantir os direitos humanos fundamentais dessas populações, incluindo o acesso a saúde integral, educação, moradia, renda, trabalho, emprego e outros determinantes sociais. 

No ano em que o Dia Nacional da Visibilidade Trans completa 20 anos, ainda são muitos os desafios encontrados pela população transgênero. A Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais foi instituída pela Portaria nº 2.836, em dezembro de 2011. Seu principal objetivo é promover a saúde integral da população LGBT, eliminar a discriminação e o preconceito institucional e contribuir para a redução das desigualdades e a consolidação do SUS como um sistema universal, integral e equânime. A política garante o acesso ao processo de transexualização na rede SUS e implementa iniciativas para mitigar riscos e dar atenção aos problemas decorrentes do uso prolongado de hormônios femininos e masculinos para travestis e transexuais. Além disso, estabelece estratégias setoriais e intersetoriais com o objetivo de reduzir a morbidade e a mortalidade entre travestis. Tudo isso é bonito no papel, mas a realidade é bem diferente. 

Um estudo recente mostrou que os homens transgêneros enfrentam discriminação e marginalização no sistema público de saúde no Brasil. Cerca de um terço das pessoas trans relatam experiências negativas com profissionais de saúde durante o atendimento. Além disso, os homens trans sentem estresse ao procurar atendimento ginecológico, devido ao desconforto de estar em uma sala de espera cheia de mulheres cisgênero. Da mesma forma, exames físicos podem ser desconfortáveis para alguns pacientes transgêneros, especialmente quando realizados por um ginecologista ou urologista. O estudo ainda destaca que muitos pacientes transgêneros podem ter enfrentado dificuldades ao longo de suas vidas e experiências traumáticas durante atendimento e exames médicos podem desencadear condições como depressão, ansiedade ou transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).

O primeiro obstáculo para pessoas trans que buscam atendimento médico é ter suas necessidades exclusivas reconhecidas. Isso inclui o reconhecimento de sua identidade de gênero e orientação sexual pelos prestadores de serviços de saúde, bem como o uso de seu nome social. O contexto social da população transgênero é frequentemente desconsiderado e marginalizado, porque para a maioria a subsistência ainda está relacionada à exploração sexual desses corpos, o que ajuda a perpetuar o estigma em torno de sua saúde, que normalmente só é considerada em termos de prevenção de infecções sexualmente transmissíveis.

A invisibilidade também está presente nas campanhas de saúde, como Outubro Rosa e Novembro Azul. Este, que acontece há quase 20 anos, exclui indivíduos que têm próstata mas não se identificam como homens, a exemplo das mulheres trans, travestis e das pessoas não binárias. Ao não abordar a questão do gênero, a campanha deixa de ser inclusiva e representativa de todos os indivíduos que podem ser afetados pelo câncer de próstata. O conhecido bigode, marca da campanha, é voltado para homens cisgêneros. Da mesma forma, o Outubro Rosa foca na prevenção e no diagnóstico do câncer de mama em mulheres cisgênero. É fundamental enfatizar que todos, inclusive homens transgêneros, travestis e indivíduos não binários, correm o risco de desenvolver a doença. Marginalizar esses grupos em campanhas tão importantes pode aumentar o risco de diagnóstico tardio.

Para construir um ambiente de saúde verdadeiramente inclusivo, é essencial que os profissionais de saúde se eduquem continuamente sobre as experiências específicas das pessoas trans e cultivem empatia para atender às suas necessidades de maneira sensível. Isso envolve adotar práticas e políticas que respeitem a identidade de gênero autodeclarada, garantindo que cada paciente se sinta validado e acolhido em sua singularidade.

Além disso, a colaboração com organizações e ativistas que defendem os direitos das pessoas trans pode ser valiosa para promover mudanças sistêmicas no sistema de saúde. A implementação de diretrizes e treinamentos específicos, juntamente com a criação de espaços seguros e inclusivos, contribuirá significativamente para a construção de uma relação de confiança entre profissionais de saúde e pacientes trans.

Ao enfrentar esses desafios de maneira proativa, podemos avançar para um futuro em que a saúde seja verdadeiramente acessível a todos, independentemente de sua identidade de gênero. É um compromisso coletivo criar um ambiente de cuidado que celebre a diversidade e respeite a dignidade de cada indivíduo, construindo, assim, uma sociedade mais justa e inclusiva para todos.

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